quinta-feira, 8 de janeiro de 2009

Ontem assisti, com algum atraso, ao filme ‘Batismo de Sangue’. Imediatamente após o filme me ocorreram uma série de pontos que engendrariam uma postagem aqui no blog.

Mas eu fui pensando, e a medida em que pensava me entristecia. Acabei fechado num silêncio nublado e choroso.

Nem tanto pelo filme em si,muito bom por sinal, mas ao pensar nos dias de hoje a partir do que fora exposto na tela.

Dá um misto de raiva e torpor pensar que o mesmo espectador que se contorce ao ver as torturas realizadas naquele período fatídico da ditadura, as mesmas mentiras seja na execução sumária do Marighela, quando os militares alegaram a ocorrência de um confronto armado, seja no momento em que frei Betto é surpreendido durante o noticiário pela acusação mentirosa de ter tramado a libertação de Lamarca e outras ações, e pensar que esse mesmo espectador não especula sobre a continuação dessa forma de agir nos dias atuais, voltados agora para os moradores da favela e os traficantes, transformados em gênios do crime e de uma periculosidade digna dos vilões da Marvel. Pior que não duvidar,muitos espectadores revoltados desse filme, poucas horas depois, podem perfeitamente ter aplaudido uma operação/chacina policial e aceitado a morte de crianças por balas de fuzil disparadas por policiais como efeito colateral de uma guerra necessária.

E esse pensamento me entristece, mais até do que enraivece.

Dá em mim, sinceramente, uma vergonha azeda de ser branco, oriundo da classe média, de ter carro, de ser respeitado por ter concluído um curso superior numa instituição pública de ensino, de morar na Glória num apartamento maneiro... sem sacanagem, dá vergonha...

Vergonha e uma certa solidão, pois é cada vez mais difícil conversar com a maioria dos meus amigos de infância e de tempos nem tão remotos, com seus ideais naziclassistas-pequeno-burgueses...

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Outro dia fui em Copacabana com uns turistas baianos que queriam levar a filha para ver aquela merda daquela roda gigante do posto 6. Choveu e paramos para tomar um chopp. Fiquei pensando que por entre aquela horda de gringos ardidos com a pele em brasa com suas roupas e expressões escrotas existiriam, dentre os coroas que ali bebiam, possíveis torturadores ou gente que de algum modo apóia esse tipo de coisa, o que no fundo dá no mesmo.

Confesso que quando me ocorre esse tipo de coisa, eu fantasio ser um desses serial killers americanos e metralho a corja enquanto grito alguma frase emblemática treinada no espelho do banheiro...

Copacabana, tirando as putas, os travecos, as gostosas, a praia, os botecos pés sujos e seus bêbados e traficantes e aviões, e alguns moradores/frequentadores pinçados a dedo, me entristece e enoja.

Meu sonho é botar os velhos milicos para jogar peteca com uma granada destravada.

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Outra cena lamentável do filme é ver médicos e padres, cardeais ou bispos, corroborando e colaborando com a barbárie.

Sem sacanagem, esses médicos estudaram medicina como quem faz curso técnico para bombeiro hidráulico, sei lá; e esses padres... bom esses padres não leram a história de Cristo. Ou pior, leram e não entenderam.

Na melhor das hipóteses.

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Eu queria na minha primeira postagem do ano escrever algo mais alegre, mais entusiasmado. Mas não deu.

E não foi culpa do filme.

Se meu “feliz 2009” ficou engasgado na garganta, esse nó quem deu foram os filhos da puta e Fleurys reais de carne e osso e sandálias havaianas que pululam das cartas dos leitores e conversas triviais e que insistem em não aprender com a ficção.

Ou, pior, vivem noutro registro de ficção e realidade.

2 comentários:

Clementina disse...

"Dá em mim, sinceramente, uma vergonha azeda de ser branco, oriundo da classe média, de ter carro, de ser respeitado por ter concluído um curso superior numa instituição pública de ensino, de morar na Glória num apartamento maneiro... sem sacanagem, dá vergonha..."

ai, ai...bem vindo ao clube.

Anônimo disse...

"Hoje,
a farda verde oliva
se tornou cinza,
hoje, é a polícia
que com vermelho pinta
nosso peito de tinta"