sábado, 29 de setembro de 2007

Democracia e Democracias

"Hoje você é quem manda
Falou, tá falado
Não tem discussão"
Chico Buarque - Apesar de Você


Escrevo motivada por um texto do professor Gilson Caroni Filho - A necessidade de uma nova imprensa - publicado na Carta Maior. Vejamos um trecho:

“Cabe ao campo democrático-popular não alimentar ilusões. Se os meios de comunicação são fatores centrais e constitutivos de uma nova esfera pública em formação, não se deve esperar conversões éticas de uma imprensa cuja estruturação está umbilicalmente ligada ao destino de conhecidas oligarquias. (...). Com a experiência acumulada em veículos como Carta Maior, Caros Amigos e Brasil de Fato, entre tantos outros, talvez tenha chegado a hora de investir em um grande jornal de esquerda. (...) Essa é a questão central da democracia brasileira. Precisamos inventar a imprensa democrática”.

O texto me instiga por duas razões: primeiro porque desvincula a reestruturação da mídia do mito de que ela pode ser “reformada de dentro” e segundo porque fala em democracia.Algumas reflexões a partir disso:

1. Cansei! Cansei dos que defendem que é possível mudar a imprensa com bons profissionais lá dentro. As pequenas concessões feitas pela grande mídia são falsas, esvaziam o conteúdo histórico daquilo que reproduzem, descontextualizam atores sociais. Pensemos em quando, por exemplo, retratam a favela e seus “aspectos bons”, para poder escapar da crítica de que a favela é sempre estigmatizada. Saem os estigmas de cena, para entrar idéias vazias, espetaculares e fantasiosas. Lembro de uma amiga que assim definia o “Central da Periferia” da Regina Casé: “Parece que favelado é um bando de chimpanzé adestrado fazendo graça no Fantástico. Um bando de pobre conformado que se vira como pode”.

2. Outra imprensa, outra mídia é algo urgente sim. Não tenho dúvida. Mas, não acreditemos que apenas novos canais irão resolver o problema da comunicação. Não vão, minha gente. Não vão, porque mais do que o monopólio dos meios, a classe dominante possui o monopólio da verdade. E isso, não se rompe com novos canais. Isso se rompe com consciência crítica, com idéias, com uma nova visão de mundo, que também não brotarão de novos canais, o que não tira destes a possibilidade de atuarem na formação daquelas. No entanto, essa responsabilidade não é só dos meios de comunicação.

3. Por último, acho que entender a libertação do monopólio comunicativo dissociado da transformação social, como se fosse um processo sem conflitos e linear, é uma armadilha do nosso tempo. Não se trata de “democratizar a comunicação”, porque democracia não é um princípio ontológico, que vai se projetar da sociedade civil em direção à sociedade econômica. Democracia é um sistema político, é mais do que sufrágio universal, é mais do que uma comunicação não monopolista. Por outro lado, estou de acordo com Gilson, à medida que estou segura de que para vivermos em uma democracia efetiva romper com a estrutura comunicacional vigente é fundamental. Mas, não acreditemos que é suficiente. E será muito pouco, se não for associado a uma ação política transformadora.

PS: Nunca é demais lembrar: dia 05 de outubro vencem várias concessões públicas de grandes grupos, como Globo e Band. Manifestações estão sendo articuladas por todo país. Informações em: fazendomedia.com e direitoacomunicacao.org.br

PS2: O Presidente Lula, em mais um capítulo de sua relação oligofrênica com a grande mídia, nomeou Tereza Cruvinel, da Globo, para presidir a TV Pública. Lá se vão 5 anos de uma bela história: eles batem, ele recua. Eles batem mais, ele faz um agradinho.

PS3: Melhor do que a Tereza Cruvinel, só o capítulo em que ele na inauguração da Record News falou da sua certeza em relação ao compromisso do Bispo Macedo e da nova emissora, com a "DEMOcratização da comunicação". Ê parreia! Vai de reto!

sexta-feira, 28 de setembro de 2007

licorado

gosto da sorte
quando diz
e traz
o que me detêm

gosto da arte
que diz-explode
bem mais além

gosto de coisas
que lembram a morte
no que a vida nos
retêm

gosto de gente
que vive e fala
o que lhe convém



gosto daquilo
e tudo outro
que me faz bem

gosto de tanto
e tudo outro
que vai além...

amarula!!!!

pois é...

é

pois é

mal o galo cantou...

cansei...

e antes que, os mais afoitos, mandem-me tomar no cu,

explico:

cansei dessa minha visão que não encontra irmão nessa tosca amplidão tupiniquim...

e ainda que perto e em redor ecoem minhas pulsações:


tão






me sinto

tão




só.




não





de beijo amor tesão







de cor flor chão



que só

assim

então


dê-me

redenção


ou qualquer coisa que não

me deixe assim tão



quinta-feira, 27 de setembro de 2007

Piratas do Caribe...

Osso duro de roer
Enviado por João Cuenca, O Globo, 27/09*

Se precisasse definir o Brasil numa frase, diria que é o país do perdão. O país da anistia ampla, geral e irrestrita. Anistia que, em lei aprovada pelo governo Figueiredo, não somente livrou a cara dos perseguidos pela ditadura entre 1964 e 1979, mas que também abriu as asas da liberdade aos perseguidores e criminosos "oficiais". Neste país de consciência livre, estupradores, torturadores e assassinos hoje jogam peteca na praia de Copacabana e curtem sua tranqüila aposentadoria. Depois de encher os bolsos, mandar bater e lotear estatais por duas décadas com sobrinhos com dificuldade de aprendizado, os milicos têm a vida que pediram a Opus Dei.
O Brasil, e isso costuma chocar mais nossos companheiros latino-americanos do que a nós mesmos, é o país mais atrasado do continente quando se fala em punir os responsáveis pelos abusos cometidos pelo regime militar. Para o bem da "paz e harmonia nacionais", o governo e a sociedade preguiçosa abaixam as orelhas e deixam pra lá. No país da anistia, tudo é perdoado com esquecimento. O que aconteceu deixa de ter acontecido, como se a roda da história se alimentasse de si mesma, num processo autofágico e irreversível.
O custo dessa amnésia tão simpática e conveniente é alto. Esse déficit moral faz com que o brasileiro aceite a idéia de tortura e violência policial como quem come um pastel de carne moída.
***
Escrevo esses parágrafos, como vocês devem imaginar, movido pela experiência de assistir à pré-estréia de "Tropa de elite", na última quinta-feira, no Odeon. Além da equipe do filme e usuais papagaios de pirata, a sessão contou com a presença, in loco, de Harvey Weinstein, criador da Miramax, vencedor de 45 oscars, produtor de blockbusters como "Pulp Fiction" e "Senhor dos Anéis" e, claro, co-produtor de "Tropa de elite". Weinstein, segundo perfil publicado pela New Yorker, é conhecido como "Harvey mãos de tesoura" pelo seu hábito de interferir na montagem dos filmes que produz. Imagino que não tenha sido o caso.
Poderia entrar no mérito exclusivo do filme e dizer que é impecável no que se propõe e que, apesar (e por causa) da pirataria, será um sucesso de bilheteria estrondoso. Ainda poderia escrever que "Tropa de elite" na maior parte do tempo parece um institucional nauseante do BOPE - no final, só faltou o "Aliste-se já!". Apesar disso, levanta algumas lebres, dá um par de tiros certeiros e deixa pelo menos uma cena na memória - aquela do policial Matias invadindo uma passeata pela paz na PUC.
Ao mesmo tempo, o filme é de um reacionarismo que talvez não tenha paralelos na história do cinema nacional. O texto é claro como pó de mármore: o tráfico de drogas é um câncer, a elite branca é hipócrita, a PM é corrupta, e o BOPE é incorruptível. Só o BOPE, através de seus imaculados princípios, nos salvará das trevas. E para isso, tem certas licenças nada poéticas - a tortura é a principal delas. Eles, que são puros, fazem o serviço sujo que nós, hipócritas de classe média, não encaramos. A lógica do discurso policial que "Tropa de elite" reproduz é cristalina.
O problema começa quando esse monstro disforme chamado opinião pública faz uma leitura do filme que corrobora esses métodos e valores. E aí, "Tropa de elite" pode perigosamente entrar para a história como o filme da geração "Cansei". O público torce pelo herói torturador e mata com ele, tortura com ele, em repetidas cenas à la Abu Ghraib - ou "Guantanamo no Rio de Janeiro", como disse meu amigo Daniel Alarcón. As celebridades enfiadas em black-tie aplaudem cada porrada, num frisson de adrenalina, e todos se convertem instantaneamente em perfumados torturadores de gabinete.
Depois, é claro, sabe-se que vem o perdão, nossa querida e mui conhecida anistia, para o torturador assassino justiceiro e para nós, apêndices conexos dessa violência, como diz a lei número 6.683. Porque, para o bem da "paz e harmonia nacionais", os fins justificarão os meios até o (nosso) fim. Enquanto isso, o pastel de carne moída segue descendo bem pela goela de todos. O uísquinho servido em coquetéis de estréia como a de "Tropa de elite" pode ajudar.

'Tropa de Elite é fascista?' Arnaldo Bloch
Pelos gritos de caveira na estréia e os urros sensuais da platéia, sei não...
Há algo de muito, muito hipócrita, no reino de euforia que cercou a estréia do filme mais celebrado da história do cinema brasileiro. A começar pelo discurso do diretor José Padilha, que perguntou à platéia que jorrava das fileiras do Odeon, quem já tinha visto o filme, "só por curiosidade". Quatro honrados gatos pingados levantaram as mãos, confessando-se piratas. O restante, em ato de alta covardia coletiva, emudeceu, e fez-se um silêncio sepulcral no palácio cinematográfico na Cinelândia.
Com a maior credulidade do mundo, sem qualquer signo de ironia, Padilha, herói de todo um Brasil de honestidade, retribuiu:
- Que bom! Uma platéia virgem!
Risadas, festa, alegria, quel esprit! Sentado no balcão lá atrás, bem malocado (o termo é proposital) dos holofotes, não resisti e gritei a plenos pulmões, ou o que resta deles, maltratados que foram no tempo remoto em que fumava (tabaco, é claro, imaginem!):
- Bando de mentirosos!
Claro que, afora aqueles dois otários (coitados, pensaram que iam ser maioria...), ninguém dos 800 vultos que hiperlotavam o cinema, apertando-se nas escadas e no chão, ia ser besta de assumir o ato de contravenção, ainda mais que estava lá o Secretário de Segurança, outro que emudeceu.
Se assumissem, como é que iam depois ter cara para gritar "caveira" em corinho (quase vomitei o pastel de cordeiro, delicioso, que comi antes) à medida que o capitão Nascimento, o nosso Rambo do Bope (magistralmente interpretado por Wagner Moura) ia se sagrando herói da noite, libertador de todos os medos e de todas as culpas, vingador natural de todos os corações desprotegidos, resultante transcendente de todo o bem e todo o mal ?
Não foi à toa que parte do público sentiu-se à vontade para gritar o lema da tropa corrupta e matadora. Afinal, ao optar pelo capitão Nascimento como narrador do filme, Padilha assumiu, de maneira sistemática, acrítica e quase pedagógica - e justificou para a média reacionária da sofrida sociedade espectadora - o discurso e o ponto de vista do que há de pior na corporação, o discurso da pseudo-razão enlouquecida dentro da loucura institucional, o discurso do "não há saída, tem mesmo é que matar." Tudo no filme que não é o discurso do Capitão Nascimento soa ridículo, risível, até porque os demais personagens são extratos estereotipados numa narrativa que se quer naturalista, mas crivada de cortes que de abrangentes nada têm.
Assim, no filme de Padilha, só a classe média-alta universitária de Zona Sul consome maconha e cocaína. Esta classe média-alta (a "galera"), para fazê-lo, necessariamente, e até com uma certa boa disposição de espírito, trava as melhores relações com o comando do tráfico, descarregando sua culpa burguesa em ongs-fantasia que nada mais são que organismos-títeres da alta bandidagem.
Curioso que, num filme tão up to date, tão distribuído por tantas majors (aliás, quando apareceu "Universal Pictures" na tela, teve gente quase esvaindo de gozo), as várias discussões sociológicas que se travam sobre a questão da violência policial (no âmbito da universidade onde estuda a bandidagem burguesa, no caso, a PUC) não há uma sílaba sequer referente a teses modernas, como a liberação do consumo de drogas, hoje altamente aceitas, ao menos como tema de debate, em qualquer foro, mas não na sala de aula retratada por Padilha, onde só há viciados alienados, com exceção do policial Matias, que conhece a realidade.
A preocupação obsessiva de Padilha é com o baseado que a galera queima, reforçando a tese surrada de que os maiores culpados pela violência do tráfico são os usuários (todos, naturalmente, burgueses). A cada menção desta abobalhada burguesia com "consciência social" (as aspas são do cineasta), gritinhos histéricos eram ouvidos em redutos da plateia, reforçados por palmas tímidas que logo se ocultavam ante a não-aderência (felizmente!) da massa presente. E ao final, quando o aspirante Matias se transformou num "policial de verdade" (leia-se: quando abandona seus princípios e aceita a tortura a crianças como método válido para seus nobres fins de vingança contra el capo) uma ovação aliviada consagrou "Tropa de elite" como porta-voz de nossas inquietações. E dá-lhe "caveira"!

Em artigo ao Globo, Wagner Moura diz que 'Tropa de elite' não é fascista
Publicada em 25/09/2007
Escrevo instigado pelo bom texto do Arnaldo Bloch sobre a sessão de estréia de "Tropa de elite". E respondo categórico à sua pergunta: Não, "Tropa de elite" não é fascista. Não é possível que alguém que tenha visto "Ônibus 174", um dos filmes mais humanistas dos últimos tempos, possa achar que o Zé Padilha (o diretor) tenha feito um filme fascista. Mas também fico preocupado quando vejo o capitão Nascimento ser tratado como herói. Fico pensando como reagiria ao filme uma platéia sueca. Não creio que pensariam naqueles policiais torturadores como heróis, assim como muita gente que vê o filme aqui também não pensa. Talvez os suecos não precisem de heróis. Talvez, aí sim uma tragédia, fascistas estejamos nos tornando nós, brasileiros, cidadãos carentes de uma política de segurança pública qualquer, que vemos naqueles policiais honestos, bem treinados, mas desrespeitadores dos direitos humanos mais elementares, a solução para o caos em que estamos metidos. Compartilhei contigo, Arnaldo, a vontade de vomitar o pastel de cordeiro no Odeon. Mas, na minha opinião, "Tropa de elite" contribui com o mais importante em épocas de crise: o debate (inimigo do fascismo). O filme traz um ponto de vista fundamental para se entender e discutir segurança pública, o olhar do policial. Eu, particularmente, discordo do capitão Nascimento em quase tudo, mas não posso deixar de ver a importância de entender seu pensamento como fundamental para o debate sobre violência no Brasil, já que é ele, assim como os traficantes e os moradores de favela, quem vive diretamente essa guerra particular, como nos ensinou, não por acaso, o capitão Rodrigo Pimentel, roteirista do "Tropa de elite", no seminal "Notícias de uma guerra particular", de João Moreira Salles.
Acho que o "Tropa", além dos méritos artísticos que tem, talvez já seja o filme pós-retomada que mais suscitou debates, a começar pela questão da pirataria, exaustivamente discutida. E não vejo, no Brasil de hoje, debate mais importante do que violência e segurança pública. Segurança pública não tem mais a ver só com a tragédia das vidas que se vão por conta da guerra polícia-tráfico-com-moradores-no-meio. Tem a ver, por exemplo, com aumento de verbas para a Previdência e para a Saúde. E, quando falo de violência urbana, quero lembrar que se para nós, moradores da Zona Sul, maioria na sessão do Odeon, a chapa já tá quente há muito tempo, imaginem para quem não pode sair de sua casa por ordem de um traficante, quem tem que passar a noite no chão com medo de bala perdida, quem é esculachado e desrespeitado pela polícia, quem não pode falar com o parente da comunidade vizinha por ordem do poder oficial, ocupante do vácuo deixado pelo poder instituído que, por sua vez, vem historicamente negligenciando essas pessoas. Isso é um fato: as maiores vítimas da violência urbana no Brasil são os moradores das favelas, e o filme mostra isso. Estou convicto: não há armas mais poderosas de combate à violência do que educação, cultura, lazer, esporte, bem-estar social e geração de emprego. É assim que o capitão Storani, oficial do Bope reformado que nos auxiliou no treinamento para o filme, tem tentado combater a violência em sua gestão como secretário de Segurança num município da Baixada. E, mais uma vez, recorro ao capitão Pimentel, na maravilhosa entrevista a João Moreira: "Enquanto o único braço do poder público que sobe a favela for a polícia, não haverá solução."
Pimentel foi também o primeiro policial que eu vi defender a legalização do consumo de drogas, que o Arnaldo reclamou não constar nos debates do núcleo PUC do filme, onde o Zé Padilha estudou. E acho que já passou da hora mesmo de discutir esse assunto com honestidade. Capitão Nascimento põe sua vida em risco todos os dias para lutar uma guerra inútil contra o tráfico e responsabiliza os consumidores pela sua tragédia pessoal. Essa tem sido inclusive uma bandeira defendida por órgãos oficiais de combate às drogas. É lógico que há uma responsabilidade individual nisso, e eu conheço muita gente que deixou de fumar maconha para não alimentar o tráfico. Mas não creio que essa campanha seja mais eficaz do que a legalização do consumo. O uso de drogas existe desde que o mundo é mundo e não vai ser a repressão que vai acabar com o consumo. Mas a legalização pode acabar com o tráfico. Eu vejo o consumidor como o elo mais fraco da cadeia. Combatê-lo é contraproducente. O abuso e o vício devem ser tratados como problemas de saúde pública. O tráfico é que é questão de segurança pública. É o tráfico que arrasta os jovens de periferia para a morte e tenho certeza de que morre muito mais gente na guerra do tráfico do que de overdose. De que forma fazer, eu não sei, mas acho que já passou mesmo da hora de discutir o que me parece óbvio e acredito que o filme contribui com isso. Só mais um dado: sabe de quem partiu a idéia de legalizar as drogas na Holanda? Da polícia, parceiro.

domingo, 23 de setembro de 2007

Esse povo que não se cansa!

Será mais uma desse povo do cansei?
(clique na foto que abre em uma janela em tamanho maior, possibilitando ler os textos que acompanham as imagens)



sexta-feira, 21 de setembro de 2007

Liberdade, Igualdade, Fraternidade e Parcialidade

Bom, antes da porrada, um pouco de contexto...

Dentro da perspectiva dos direitos humanos e da cidadania, compreendida, grosso modo, no rol de direitos civis, políticos e sociais, que têm como exemplo a liberdade de expressão, o direito de escolher seus representantes ou mesmo concorrer a um cargo político e o direito de acesso à moradia, saúde, educação, dentre outros serviços básicos, respectivamente, encontramos uma alternância que, a meu ver, melhor sintetiza as diferenças primordiais entre um sistema capitalista de inspiração liberal e outro, de cunho socialista. Noção esta de cidadania, engendrada e instaurada a partir dos ideais da Revolução Francesa, a saber: liberdade, igualdade e fraternidade.

Desse modo, a liberdade estaria mais ligada ao exercício dos direitos civis e políticos, enquanto a igualdade estaria mais diretamente relacionada com o usufruto dos direitos sociais. Talvez, a partir desse ponto de vista, podemos dizer que os governos capitalistas priorizam a liberdade em detrimento da igualdade, tendo como produto final uma sociedade extremamente injusta e desigual. Já os governos ditos socialistas, historicamente, priorizaram uma sociedade mais igualitária, com uma distribuição das riquezas mais homogeneizada, relegando, entretanto, pouco espaço e oportunidade para o desenvolvimento e realização dos anseios individuais, assim como o exercício da crítica e da expressão de contrariedades e objeções.

A fraternidade seria o sentimento e a postura que daria liga numa sociedade de homens livres e iguais que se respeitam e orientam em prol de negociar os interesses individuais e coletivos segundo o horizonte ético de um bem comum.

Segundo esse panorama traçado, o grande desafio contemporâneo está em engendrar e desenvolver uma forma de governo e sociedade que sejam liberais sem serem injustos, igualitários sem autoritarismo...

Pois bem...

No entanto, o que vemos hoje em dia nas ditas sociedades alinhadas ao paradigma neo-liberal, como a nossa, e seus templos sagrados – veículos de comunicação e parlamento – é uma distorção dos conceitos de liberdade de expressão e representação política.

No templo midiático, os ditos formadores de opinião (de merda, a meu ver), criam um ambiente editorial totalmente vinculado a algumas pseudo-verdades, direcionado para um público específico (a classe média metida a besta que come feijão com arroz e arrota caviar), e amparada por uma aura de imparcialidade. Imparcialidade que, mais do que mito, é o argumento mais imbecil que um jornal pode dar acerca dos seus posicionamentos e explanações.

Imparcialidade como critério ético chega a ser uma piada... Pois não há critério mais antiético do que afirmar ser imparcial enquanto opina...

Bom, a menos que seja uma besta... ou o Ali Kamel.

Aliás, fraternidade... A MEU VER, tem a ver com ser parcial...

Já no templo rarefeito dos parlamentos, a representação política é esculachada e transformada em moeda corrente, tipo cigarro em cadeia... Nessa nossa aberração da democracia, como prefiro acreditar, os políticos cada vez mais demonstram representar interesses particulares e nos fazem crer que a política se refere única e exclusivamente ao jogo de disputas, conquistas e manutenção do poder. “Foda-se o povo que eu supostamente represento”, deve ser o pensamento hegemônico dessa cambada...

E o pior é que o noticiário internacional nos dá mostras que isso é um fenômeno mundial, muito comum no oráculo universal da democracia, como se autodesigna a sociedade norte americana... vide maracutaias eleitoreiras do Bush, invasão do Iraque, etc.

Aliás, caro Busha, confundir APEC com OPEP não é gafe, é ato falho!!!!

Ou seja, digníssimos: civilização é a barbárie bem vestida...


Bem... leiamos Veríssimo...


Rodrigo Bodão

Massacre

Winston Churchill não era flor que se cheire. Ou, como diria o Millôr na língua dele, “a flower you can smell”. Recomendou que se usasse gás venenoso contra os curdos - como, anos depois, fez o Saddam - e era um entusiasta da guerra química. Mas isso foi na sua juventude, quando atrocidades contra povos exóticos não causavam tanta discussão na metrópole. Em vez de enforcado, Churchill se transformou no grande estadista cujas atitudes e frases ajudaram a resistir ao nazismo e inspiraram uma nação na sua melhor hora. Seus charutos, suas bochechas de bebê e, acima de tudo, sua retórica triunfante sobreviveram a todas as lembranças de um passado não tão glorioso e lhe garantiram uma posteridade confortável.

Mas uma das frases mais famosas de Churchill não tem nada a ver com seus discursos de guerra. É aquela em que ele afirma que a democracia é o pior sistema de governo disponível, com exceção de todos os outros. O velho aristocrata, ele mesmo um exemplo do ideal ciceroniano de poder de casta, dizendo que a democracia é falha, insuficiente, irritante, confusa, difícil e provavelmente anti-natural, mas ainda é melhor do que todas as suas alternativas possíveis. Uma frase que precisa ser repetida de tempos em tempos, principalmente em países, como o Brasil, que já experimentaram as alternativas, mas às vezes parece que esqueceram. Porque aqui desesperar da democracia vai se tornando cada vez mais tentador.

Renan Calheiros disse que o que houve no Senado fechado na quarta-feira foi uma vitória da democracia. Não foi. O processo de votação pode ter sido formalmente democrático, apesar de escondido, mas se há algo que vem acumulando derrotas nos últimos tempos entre nós, culminando com a da última quarta-feira, é a democracia. A cada nova desmoralização de políticos e política ela apanha mais um pouco. Há quem diga que o fato de ainda estar de pé, mesmo que só formalmente, é um bom sinal: em outros tempos ela já estaria na lona e a alternativa estaria nas ruas. Mas a surra continua. Como nas lutas de boxe em que só um lado apanha, sem defesa, sem reação possível - e o pior, sem torcida - não é um espetáculo bonito.

Luís Fernando Veríssimo

16/09/2007

sexta-feira, 14 de setembro de 2007

Parem o mundo que eu quero descer

Eu queria falar do Renan Calhorda e sua absolvição. Depois, pensando no calhorda lembrei de um poema do Brecht. E depois, não consegui escrever mais nada, porque o mundo tá complexo.

Finalmente, li um trechinho lindo do Fernando Pessoa hoje pela manhã, que vale ser compartilhado. Meus companheiros de blog que perdoem minha fase sensível (leia-se TPM), daqui a pouquinho passa...

Vamos ao Brecht...

Expulso Por Bom Motivo

Eu cresci como filho
De gente abastada. Meus pais
Me colocaram um colarinho, e me educaram
No hábito de ser servido
E me ensinaram a dar ordens. Mas quando
Já crescido, olhei em torno de mim
Não me agradaram as pessoas da minha classe e me juntei
À gente pequena.

Assim
Eles criaram um traidor, ensinaram-lhe
Suas artes, e ele
Denuncia-os ao inimigo.
Sim, eu conto seus segredos. Fico
Entre o povo e explico
Como eles trapaceiam, e digo o que virá, pois
Estou instruído em seus planos.
O latim de seus clérigos corruptos
Traduzo palavra por palavra em linguagem comum,

**********************

E o Pessoa...

Eu quero um colo, um berço
Um braço quente

Em torno ao meu pescoço
E uma voz que cante baixo
E pareça querer me fazer chorar
Eu quero um calor no inverno
Um extravio morno da minha consciência
E depois em som
Um sonho calmo
Um espaço enorme
Como a lua rodando entre as estrelas

terça-feira, 11 de setembro de 2007

AAAAAAAAAAHHHHHHHH, tá bom!!!!! Entendi...

Desabafo...

Ultimamente tenho desenvolvido trabalhos e textos junto ao setor de comunicação de uma instituição não-governamental carioca (sem merchandising, certo...). Dentro dessas tarefas, não posso nem dizer que vez por outra, mas SEMPRE tenho que cortar, cortar e cortar, lapidar, lapidar, lapidar, sintetizar, sintetizar, sintetizar meus escritos até que caibam na porra da diagramação esperada!!!!

Puta que pariu!!!! Isso cansa...

E o pior é que o melhor do texto, ou seja, uma análise mais aprofundada do assunto, fica de fora...

Lembro de um comercial de um poderoso jornal de merda paulista, vulgo Estadão ou antro de pimentas da veiga assassinos (aqui cabe o merchandising, porque ao contrário), onde se elaborava a importância da leitura de jornais para você ter assunto no dia a dia...

É...

Para quem lê jornal, realmente não falta assunto...

Falta profundidade...

E o pior é que gera uma cambada de mentes rasteiras que se acha especialista no assunto porque leu uma matéria ou viu uma reportagem...

Se ainda lessem os artigos e as crônicas...

(nada contra vcs meus queridos jornalistas companheiros de blog)

MAIS UM CRIME BANAL NUMA NOITE QUALQUER (e agora não tem poesia alguma nisso)

RELATO DE UM REFUGIADO DE UMA FAVEL A CARIOCA (LUTANDO CONTRA A MILÍCIA)

O relato a seguir nos foi enviado em julho e contém denúncias de próprio punho de Jorge, sequestrado e provavelmente assassinado (falta confirmação da identificação do corpo) no último dia 07/09. Como se pode ver, Jorge a esta altura (dois meses atrás), já havia procurado inúmeros órgãos sem sucesso, quando decidiu partir para a denúncia pública como uma forma de pressionar por providências. O primeiro órgão da grande imprensa a veicular a denúncia foi a Folha de São Paulo, em 05/08/2007, que divulgou que já havia inquéritos na Draco (Delegacia de Repressão às Ações do Crime Organizado) e na Corregedoria Geral Unificada da Secretaria Estadual de Segurança Pública sobre os policiais envolvidos. Mas foi somente após publicação de matéria em O Globo, em 25/08, que alguma coisa foi feita, e quatro dos cinco policiais acusados foram presos administrativamente (não foi prisão preventiva), para serem libertados no dia 03/09.

As palavras de Jorge e o trágico desfecho do caso dizem tudo sobre a participação e conivência do Estado na existência e ação dos grupos paramilitares assassinos. Esperamos, pelo menos, da sociedade civil, movimentos populares e organizações defensoras dos direitos humanos, o mesmo empenho na denúncia internacional e na busca da condenação dos assassinos (diretos e indiretos) de Jorge, que demonstraram em outros casos recentes, como o assassinato da freira Dorothy Stang em fevereiro de 2005.

Comissão de Comunicação da Rede de Comunidades e Movimentos Contra a Violência

*********************

Sou Jorginho,e gostaria de relatar a vocês o que vem acontecendo na comunidade na qual eu presido. Desde o dia 05 de Novembro de 2006 que nossa comunidade está sendo dizimada.Um grupo de extermínio composto por 5 Policiais Militares invadiu com seus colaboradores a comunidade e desde então vivemos uma verdadeira Ditadura. Nesses quase 9 meses de ocupação de nossa comunidade tenho contabilizado cerca de 200 mortos e as famílias dos mesmos não tem a quem reclamar.Isso porque tanto a 22 DP quanto o 16 BPM são omissos e todo o poder público protege esse grupo de extermínio denominado "Milícia"tanto que venho a todo esse tempo informando-os mais sem sucesso algum. Só para você ter uma noção menores são espancados diariamente, a associação não pertence mais aos moradores, taxas são cobradas aos comerciantes e empresários locais e moradores e o não pagamento de tais taxas implica até em ameaças de morte. Já informei a Comissão de Direitos Humanos da Alerj, a Corregedoria Interna da Pmerj, a Corregedoria Geral Unificada das Polícias, a Secretaria de Segurança Pública, ao Ministério Público do Estado, a 1 DPJM, ao 16 BPM ( Cel.Marcos Jardim tel.:9602-1616 ), a 22 DP (Dr.Alcides Ianturno de Jesus tel.:3399-6222) e a varios Deputados Estaduais mais sem sucesso. Inclusive pedi a esses Deputados que endosse meus pedidos de "Policiamento Ostencivo"na comunidade para guardar-nos tanto do grupo de extermínio quanto dos "Traficantes"que sempre vem à comunidade para tentar retoma-la mais nada acontece. No dia 5 de Abril de 2007 fui expulso de minha comunidade com direito até a "Ameaça de Morte", informei isso a todo o "Poder Público"mais nada aconteceu a esse grupo de extermínio ( Eu e Minha Família é Que Tivemos Nossa Dignidade Privada por esses "Marginais Pagos Pelo Estado Para Matar, Sequestar, Extorquir, Espancar e Fazer Toda Sorte de Maldade Contra a População". Já não aguentamos mais o descaso das Autoridades que com sua "Corrupção"está Dissimando as Comunidades Carentes para mostrar ao Mundo Exterior a aparente segurança com o intuito de promover o turismo quando os verdadeiros donos do estado, ou seja, a população não tem estrutura alguma.

Informações para serem apuradas,composição do grupo de Extermínio:

(neste ponto o líder comunitário dá o nome de cinco PMs)
UM ABRAÇO!

OBS: Bom, resolvi não postar os nomes dos caras... vide desfecho trágico da história...

Achou que sou covarde, medroso, tenho medo da polícia...tenho mesmo...

Assunto por assunto, sete palmos embaixo da terra não é propriamente a profundidade que eu me referi acima...

Rodrigo Bodão

quarta-feira, 5 de setembro de 2007

ai ai... .

a ordem dos fatores...


não importa...





































pode ser...

pode até partir de um racismo inconsciente...

duvido...

a hereditariedade que mais me orgulho é carregada de melanina...

mas que esse juiz do STF agiu como um macaco, agiu...

nem tanto pelo adestramento...

mais pelo exibicionismo aparente...

se eu quiser falar com deus...

deus...bora trocar uma idéia...

tô precisando de um,

(odeio essa palavra)

(ARGH)

milagre...


seguinte

ao invés de vinte
e quatro horas

dá pra aumentar o dia,
pra, sei lá,

sessenta?

não,não, não, não, peraí...

olha só: oito pra dormir,
uma pracordar,
outra, me arrumar,
uma e meia pra chegar,
seis pra trabalhar,
uma e meia pra voltar,
quatro pra estudar,
duas pra malhar,
três para formar

e ir buscar...............................................

(quinze minutos pra curar ressaca nem conta, certo?!)

dezoito de butiquim,
uma para mim,
quatro pra fuder,
conversar,
recuperar
e vice-versa

sete pra pensar
e uma pra botar
no papel

pode botar aí duas pra telefonemas e visitas familiares...

quanto deu????sessenta e um...

então tá, olha só, cinco pra trabalho, fechou????

Já é???????!!!!!!!!!

segunda-feira, 3 de setembro de 2007

Narcisológico

Domingo...dia de feira, de dormir até mais tarde, de ler o jornal inteiro sem pressa e, hoje, dia ainda de visitar minha progenitora e de gozar dos prazeres de filho, não lavar a louça, comer rosbife, ouvir histórias, encontrar outros familiares, ver TV a cabo, etc...mas também dia de desprazeres solenes, compartilhando hábitos que por mais que eu tente esta digníssima senhora que me gerou ainda não conseguiu abandonar...

Minha mãe assina a Veja...sempre que eu chego, ensaio um discurso acerca do lixo representado por esse fatídico veículo da mídia podre nacional, que uma revista que publica um Diogo Mainardi não pode ser algo que preste, que ela deve parar de dar dinheiro e prestígio pra esse tipo de gente, e tal, mas acabo por folhear e ler, não sem um esgar irritado, seus absurdos e suas opiniões desprezíveis...

Bom...

No exemplar que tenho agora em mãos, no canto superior da capa, está estampada a manchete: “Um livro mostra que a elite é o lado bom do Brasil”. Na verdade, esta revista é até velha, e já na semana passada eu tomara contato com essa frase, não lhe dando maior atenção do que um 'puta merda, os caras se superam’ e jogá-la de volta para a mesa de centro da sala. Mas depois que o Veríssimo escreveu mais uma de suas belíssimas crônicas sobre o assunto, me animei a enfrentar a fera.

Pouparei os possíveis leitores desse blog de uma descrição pormenorizada da matéria, para variar, desenvolvida num tom extremamente preconceituoso e, no caso, assumida e festivamente elitista. O tal livro fora baseado numa pesquisa intitulada “Pesquisa Social Brasileira”, desenvolvida por um sociólogo chamado Alberto Carlos Almeida, junto ao DataUff, instituto da Universidade Federal Fluminense e financiada pela Fundação Ford. A tal pesquisa procurou mapear o sistema de valores e as posições da população brasileira quando confrontada com situações de conflito ético, tais como “é certo recorrer ao jeitinho para resolver problemas como o de se livrar de uma multa”, “se os moradores permitirem, os empregados devem usar o elevador social” ou “a polícia está certa em bater nos presos para que eles confessem seus crimes”. Dada a questão, perguntava-se ao entrevistado se este concordava ou discordava da afirmação. Sim ou não, certo ou errado.

Bem, não pretendo criticar (e muito menos ler) academicamente essa pesquisa. Antes, pretendo comentar o posicionamento da revista e a matéria do seu jornalistazinho de merda.

Num breve teste elaborado pelo pesquisador, foram descritas diversas situações onde os leitores dessa horrenda revista eram convidados a responder certo ou errado, segundo seu juízo pessoal. Somava-se, ao final, o número de concordâncias e discordâncias, sendo posteriormente apresentados os resultados.

Ao que parece, baseado nos resultados da pesquisa, sua posição junto à elite do pensamento dependia do número de discordâncias apresentado, quanto maior, mais próprio de mentes brilhantes e de maior nível de escolaridade, com características tais como a crença de que o estado deve ser mínimo...

Como um perfeito Narciso, o texto em questão faz um elogio pomposo, sem dúvida, aos leitores dessa revista, enaltecendo suas posições e demonstrando o quanto estão corretos em seus julgamentos éticos e procedimentos cotidianos.

Bem, falar é fácil... mas do mesmo modo acredito que, por exemplo, os pais dos garotos da elite carioca da Barra da Tijuca que espancaram a empregada doméstica Sirley afirmando que pensaram se tratar de uma prostituta, responderiam esse questionário afirmando que o jeitinho brasileiro é uma praga nacional, mas quando de hipotética a situação passa a ser real, tudo muda de figura...lembram...

Dá para entender, a partir do que é exposto, porque parcela da opinião pública defende ações assassinas nas favelas e espaços populares...

O que não dá para entender é a posição ética deste pesquisador que, indubitavelmente, a título de promoção de seu trabalho, colabora por acirrar esse verdadeiro apartheid social em que vivemos, montando um pseudoteste ridículo para a revista...

Espera-se dos que tem curso superior, ao menos, que percebam os limites e alcances de uma pesquisa quantitativa deste tipo...e que não dá para comprar essa conclusão infundada veiculada por essa nefasta revista...

(leitores, por favor, não comprem o livro e muito menos a revista...esperem que ela apareça na sala de espera do seu dentista...ou no Fantástico)

Fora povo! Veríssimo

Abaixo, o texto de Luís Fernando Veríssimo sobre a tal pesquisa, publicado no Globo do dia 30 de agosto.

Fora povo!

Pesquisa recente concluiu que a elite brasileira é mais moderna, ética, tolerante e inteligente do que o resto da população. Nossa elite, tão atacada através dos tempos, pode se sentir desagravada com o resultado do estudo, embora este tenha sido até modesto nas suas conclusões. Faltou dizer que, além das suas outras virtudes, a elite brasileira é mais bem vestida do que as classes inferiores, tem melhor gosto e melhor educação, é melhor companhia em acontecimentos sociais e é incomparavelmente mais saudável. E que dentes!

A pesquisa reforça uma tese que tenho há anos segundo a qual o Brasil, para dar certo, precisa trocar de povo. Esse que está aí é de péssima qualidade. Não sei qual seria a solução. Talvez alguma forma de terceirização, substituindo-se o que existe por algo mais escandinavo. As campanhas assistencialistas que tentam melhorar a qualidade do povo atual só a pioram, pois, se por um lado não ajudam muito, pelo outro o encorajam a continuar existindo. E pior, se multiplicando. Do que adianta botar comida no prato do povo e não ensinar a correta colocação dos talheres, ou a escolha de tópicos interessantes para comentar durante a refeição? Tente levar o povo a um restaurante da moda e prepare-se para um vexame. O povo brasileiro só envergonha a sua elite.

Se não tivéssemos um povo tão inferior, nossos índices sociais e de desenvolvimento seriam outros. Estaríamos no Primeiro Mundo em vez de empatados com Botsuwana. São, sabidamente, as estatísticas de subemprego, subabitação e outros maus hábitos do povo que nos fazem passar vergonha.

Que contraste com a elite. Jamais se verá alguém da elite brigando e fazendo um papelão numa fila do SUS como o povo, por exemplo. Mas o que fazer? Elegância e discrição não se ensina. Classe você tem ou não tem. Mas o contraste é chocante, mesmo assim. Esse povo, decididamente, não serve.

Se ao menos as bolsas-família fossem Vuiton...

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