No dia 4 de dezembro último, Matheus Rodrigues, de oito anos, foi assassinado pela polícia na favela Baixa do Sapateiro, no conjunto de favelas da Maré. No dia 6 de julho era assassinado pela polícia João Roberto, de três anos.
A diferença da cobertura da mídia em relação aos dois casos é gritante. Embora todas as testemunhas confirmem que não houve troca de tiros, a polícia insiste em dizer que na morte do menino Matheus o tiro partiu de traficantes rivais que duelavam durante a manhã do dia 4. No caso de João Roberto, graças a câmeras de segurança, foi comprovado que os tiros (17 no total) saíram de Policiais Militares, que confundiram o carro com o de assaltantes.
A cobertura dada ao caso de João Roberto, agora em destaque por conta do julgamento dos policiais envolvidos, tem maior destaque que a morte do garoto Matheus, que teve apenas sua morte divulgada por conta da mobilização de organizações de direitos humanos que acionaram a imprensa e a Comissão de Direitos Humanos da Câmara. As notícias pararam por aí. Isso se deve à valoração da vida pelo espaço geográfico. Dependendo de onde mora, a vida tem mais valor e merece ser discutida.
Mas o que choca mais é o que os dois casos têm de igual: o despreparo da polícia, a morte brutal de duas crianças, e a impunidade. Para o promotor Paulo Rangel, que atuou no julgamento do policial acusado de matar João Roberto, a absolvição do policial legitima a execução de pessoas no Rio de Janeiro.
Avaliando alguns casos, em 2004 em apenas 15 dias tivemos 5 crianças e jovens mortos em favelas do Rio. Uma delas, Renan da Costa, de três anos, morreu com um tiro de fuzil na barriga, disparado por um policial. O acidente aconteceu também em uma das favelas da Maré, na Nova Holanda. Nenhum culpado.
A preocupação do promotor, válida, talvez tenha chegado tarde demais. O secretário de Segurança Pública, José Mariano Beltrame já disse, em outubro de 2007, que "um tiro em Copacabana é uma coisa. Um tiro na [favela da] Coréia, no Complexo do Alemão, é outra". Enquanto essa lógica permanece, não há muita preocupação da sociedade. Mas quando ela ultrapassa os limites e começa a afetar as classes mais nobres da cidade, essa política deve ser combatida.
Talvez a preocupação da justiça não esteja em legitimar a execução de pessoas no Rio. Mas em não abrir precedentes para que todos os culpados por mortes absurdas em diversas partes da cidade carioca sejam julgados.
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