segunda-feira, 11 de maio de 2009

é o amor (2)

Sexta-feira, 5 e meia da tarde. Toca o telefone. Como sexta é dia de expediente acabar antes das seis, e o número era desconhecido, lancei a cada vez mais famosa “atende pra mim, clê”. Ela atende. – pois não, aqui é a clê, assistente do capilo... desliga. – quem era? – desligou logo que comecei a falar. – melhor assim (aqui vale um parênteses para explicar que esse hábito aprendi com a clê, que vez ou outra pede preu atender o celular dela e preu dizer que sou assistente dela. Ela adora, e eu comecei a gostar também. Especialmente às sextas no fim do dia).

Mais tarde, por volta das 8 da noite, o mesmo número chama. Clê já tinha partido do bar do Rodrigo, na Maré, pra num sei aonde, e deixou a conta da cerveja preu pagar. Já estou me acostumando. Aí, curioso, e já levemente alterado por conta das poucas cervejas que bebi nesse meio tempo, resolvo atender.

- er... oi. – opa, quem fala, quer falar com quem?, falei, já com a voz meio alterada. – eh, quem ta falando? – eu, oras. Você num sabe pra quem ta ligando? - respondi, estilo saraiva, paciência zero - quem ta falando pergunto eu! – é o seguinte: eu decidi ligar pra um número desconhecido para dizer que eu estou em casa sozinho e vou me matar depois que eu desligar esse telefone. eu queria comunicar a alguém e dos números que vinha tentando o seu foi o primeiro que chamou depois de umas 10 tentativas.

- ai, ai, ai, que delírio meu camarada, vai se matar? Num faça isso, você é um cara novo (e eu nem sabia quem era ainda, mas já pululavam nomes de amigos (?) que poderiam querer me sacanear).

- vai me dizer que é por causa de alguma fêmea? – é. – virou corno e agora quer se matar?, deixa disso parceiro (já íntimo). – não, ela morreu. – ah, e você acha que vai encontrar com ela no paraíso?, deixa de ser bobo rapá! Sai desse clima e toma uma cerveja pra se animar. – não, vou me matar.

- camarada, cê ta na merda?, sem dinheiro? – não, dinheiro não é problema. – então peralá, CE num vai se matar e deixar dinheiro em banco. Já que sou seu amigo, estou te escutando, desce aí, faz um saque hoje, eu pego o dinheiro contigo... – que isso cara?, ta maluco? – maluco não, maluco é você que vai se matar e deixar esse dinheiro aí. Então pelo menos paga a conta hoje, vão pra lapa, e é tudo por sua conta. Depois você se mata. E vai até ter mais coragem depois de bêbado. – então ta.

Foi assim que minha sexta-feira dura, bebendo na pendura na Maré, acabou na lapa, completamente bêbado, indo pra casa de táxi e com os R$ 7,50 ainda no bolso.

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Sábado. Quatro da tarde. Toca o celular do bode. – quem fala porra, ligando essa hora da manhã? – manhã não cara, já é de tarde. – foda-se, pra mim é de manhã, quem é?! – er... é o seguinte: eu decidi ligar pra um número desconhecido para dizer que eu estou em casa sozinho e vou me matar depois que eu desligar esse telefone. eu queria comunicar a alguém e dos números que vinha tentando o seu foi o primeiro que chamou depois de umas 10 tentativas.

- ah, vai pra putaquilpariu. Vai me acordar pra isso? Eu te conheço? – não, eu liguei aleatoriamente, e o seu número, como disse, foi o único que atendeu. – porra, então se mata, já sei, pode ir em paz...

Silêncio no telefone, mas o que ligou não desligou. Bode começa a pensar sobre o suicídio (“Tem gente que chama de cena, viadagem, fraqueza, histeria. Eu respeito, na medida em que respeito as intensidades de cada um – além do fato do suicídio ser uma idéia dramática que de vez em quando me ocorre e de já ter tentado fazê-lo noutro momento de minha vida. Também fui salvo por um telefonema, ainda que não tenha ligado para ninguém, e acordei em um hospital todo entubado...”) – alô, alô, grita o bode. – oi, suspira aliviado na outra linha. – você não se matou ainda não?, pergunta, pra ganhar tempo. – não, não... – então vamos tomar uma cerveja, trocar uma idéia, já tentei me matar também, chega aqui na glória que tenho um papo pra te dar. – ah, glória. – isso, e traz dinheiro que eu to duro.

Foi assim que o sábado de bodão, que ele nem ao menos levantaria da cama, acabou no domingo, às 10 da manhã – na verdade acabou pro André, que o bode deixou ele e foi pra outras bandas, como é de costume.

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Maracanã. Domingo. Fluminense contra o já freguês São Paulo. Faveleiro, tricolor carioca, atende o telefone. – alô, alô. Porra quem é?, não estou escutando, estou no maraca, maior barulho. Fluminense acaba de fazer um gol. Quem? É gol porra! – vou me matar. – quê, é são paulino? Há ha ha, vai morrer mermo, mermão! Hoje só dá fluzão!

O jogo acaba. O telefone toca de novo. Faveleiro no bar, já bêbado.- alô, nensêê... – vou me matar cara, e você fica aí gritando? – quê? Se matar? Quem ta falando. – er... é o seguinte: eu decidi ligar pra um número desconhecido para dizer que eu estou em casa sozinho e vou me matar depois que eu desligar esse telefone. eu queria comunicar a alguém e dos números que vinha tentando o seu foi o primeiro que chamou depois de umas 10 tentativas.

Ah, cara, depois desse jogo do meu fluzão, num dá pra se matar não, chega aqui, vamos tomar uma cerveja. Toma seu último porre antes de morrer, deixa de ser bobo.

Foi aí que o domingo de Faveleiro, que começa apreensivo com o jogo do fluminense, acaba na segunda de manhã, num bar, com uma vitória do seu time, ao lado do André, bêbados. E tudo por conta do André.

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Terça-feira, faltam dois minutos pra meia noite. Clementina, Capilo, Bodão e Faveleiro estão num bar, em Irajá. Todos colocam a mão no bolso. Antes mesmo de ficarem bêbados, e um cortando o outro que contava sobre um telefonema estranho de um cara mais estranho ainda (- cara, vocês não vão acreditar. – porra, o que aconteceu é que é inacreditável, etc., etc.). Ao mesmo tempo, recebem um sms (pra quem não sabe, mensagem de celular) do número do “desconhecido”:

“Quando ler esta mensagem, já terei pulado do décimo-segundo andar de meu prédio, no Jardim Botânico. Mas quero falar que morri feliz, após realizar meu desejo de conhecer os ombdsminianos. Mas não foi o suficiente para fazerem-me mudar de idéia, já que todos se preocuparam muito mais com meu dinheiro do que com minha companhia. Abraços do além.”

3 comentários:

Clementina disse...

não dá pra dizer que o cara não morreu feliz. partiu em paz...

capeta disse...

ele se preparou pra chegar no INFERNO!

Rodrigo Bodão disse...

Muito bom, Capilo, muito bom!!!!